Um imenso amor moveu a vida da primatóloga Dian Fossey. Não por uma pessoa especificamente, mas sim por um coletivo de gorilas das montanhas, espécie ameaçada de extinção, que habita uma (enorme) área bem no coração da África. Sua história, suas práticas controversas, seu ativismo e a intensa luta (que lhe custou a vida) pela preservação desses primatas ganhou o mundo após o lançamento de sua autobiografia “Gorillas in the mist” e do filme “Na montanha dos gorilas”, de 1988, estrelado por Sigourney Weaver.
A vida de Fossey é fascinante e foi lindamente recordada neste infográfico da Folha de S. Paulo, relembrando os 30 anos de sua morte (um assassinato até hoje não solucionado). Décadas depois, a má impressão que o filme e o livro passaram (região conflitiva, traficantes de animais, violência contra esses primatas) pouco a pouco vem sendo apagada, com muito esforço das populações locais.
Isso porque o maciço de Virunga – uma enorme cadeia de vulcões onde toda a história de Fossey se desenrolou – atualmente é um dos pontos turísticos mais interessantes (e vitais) da África. Ele ocupa uma área de 450 quilômetros quadrados, no território de três países: República Democrática do Congo, Uganda e Ruanda. E, sim, os famosos primatas ainda estão por lá.
PARQUES E TREKKINGS
Cada país tem uma unidade de conservação e respectivos parques na área do maciço: o Virunga National Park (RDC), parque nacional mais antigo da África, criado em 1925; o Mgahinga Gorilla National Park (Uganda) e o Volcanoes National Park (Ruanda). É possível acessar as montanhas (e ver os gorilas) de cada um desses países.
Embora os gigantescos primatas sejam os principais chamarizes, muitos vão ao Virunga para aproveitar a rica diversidade de climas e habitats. Nessa cadeia, é possível ver de florestas tropicais a glaciares, além de deltas pantanosos, savanas e planícies formadas por lava, só para citar algumas atrações. Um total de 86 espécies de mamíferos vivem lá, sendo 34 delas de grande parte (como os 20 mil hipopótamos da região). E mais: é a casa de mais de 250 espécies de pássaros, incluindo os que vão de “férias”. Por exemplo, diversas aves siberianas passam o verão nessa área.
Os três países passaram por graves conflitos e crises humanitárias (que também ameaçaram a sobrevivência dos gorilas) e o ecoturismo vem sendo uma maneira de reerguer suas economias. A área do Virunga é segura e a preocupação com sua sustentabilidade vem aumentando cada vez mais. Há uma forte vigilância nas atividades das touroperadoras que atuam nos parques ao redor.
LAR DE MAIS DE 10 MIL GORILAS
Felizmente, ficaram para trás barbaridades como ações de caçadores de gorilas que buscavam mãos e cabeças desses animais como troféus para europeus. Era contra essas práticas que Dian Fossey lutava. Conhecida entre os ruandenses como Nyiramacibili (“mulher que vive sozinha na floresta”), ela conseguiu (colecionando inimigos) que a população dos gorilas das montanhas aumentasse. Seu Dian Fossey Gorilla Fund ainda é extremamente atuante.
Hoje, estima-se que vivam de 600 a 900 indivíduos dessa espécie na região. Além deles, na mesma área também habitam os gorilas da planície (com 10 mil exemplares). Tidos como “gigantes gentis”, esses animais são amáveis e, em geral, não se assustam com a presença de humanos.
No entanto, há uma série de restrições e regras para realizar os tours. A observação dos gorilas das montanhas dura no máximo uma hora. É preciso usar máscaras cirúrgicas na presença deles (para evitar que peguem doenças) e vale lembrar que só pessoas saudáveis podem participar. Apenas maiores de 15 anos estão autorizados a fazerem o passeio. Não é permitido comer nem fumar perto deles e recomenda-se ficar a pelo menos cinco metros de distância. É fundamental contratar serviços que respeitem essas regras.
Se quiser mesmo ver esses primatas, prepare-se para gastar. Saindo do parque nacional congolês, por exemplo, os trekkings de observação do gorila das montanhas custam 400 dólares. Outros tipos de passeio também são comuns no Virunga National Park, como observação de chimpanzés, visita ao vulcão ativo (com lago de lava) e diversos tipos de trekkings – todos mais em conta que a visita aos gorilas.
EMPODERAR AS COMUNIDADES LOCAIS
Há mais de uma centena de operadoras que realizam os passeios. O site do parque nacional ugandense recomenda algumas (nos três países). A Red Rocks Rwanda é uma das mais conhecidas e realiza tours saindo dos três países. Um de seus diferenciais é formular programas com a participação das comunidades locais, beneficiando-as. De artesanato a oficina de cerveja de banana, é possível interagir com eles. Além disso, a empresa tem programas de voluntariado.
O Virunga Community Programme, com sede em Goma (República Democrática do Congo), é outro exemplo de iniciativa que segue essa linha, com passeios responsáveis saindo de territórios congoleses, ruandenses e ugandenses. Eles têm também atendimento especial a surdos. De acordo com esta matéria do Chwezi Traveler, estima-se que, nos três países, existam mais de 400 projetos voltados para as comunidades, com intenções diversas, como a construção de hospitais, escolas, centros de comércio e abastecimento de água.
Além de ser uma premissa básica do turismo responsável e sustentável, a participação direta dos habitantes no turismo é, no caso do Virunga, uma questão de sobrevivência mútua – dos animais, da mata e da população humana. Isso porque uma das grandes pelejas (e talvez a tragédia) de Dian Fossey foi bater de frente com locias que usavam os recursos naturais da região e criavam gado para subsistência.
Os sites citados, incluindo os dos parques, têm valiosas sugestões de acomodações – que vão das mais roots a lodges luxuosos. Para saber ainda mais sobre a preservação dos animais nas montanhas Virungo, vasculhe os sites da International Gorilla Conservation Programme e da Wildlife Conservation Society. Este relato em primeira pessoa também conta com diversas informações úteis.
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Escala de sustainatripity: – 10 – Preservação de espécies animais e vegetais é coisa muito séria nessa região. Eles vêm fazendo um trabalho comprometido e que esperamos que renda cada vez mais frutos para as comunidades e para a economia local, de modo a contemplar todo o triple bottom line.
Por que vale a pena? Eu não sou uma pessoa muito chegada a observação de animais ou safáris, por mais sustentáveis que sejam. No entanto, a força e o carisma desses primatas me deixaram louca de vontade de vê-los de perto. Além disso, saber que as comunidades locais estão conseguindo melhorar a vida por conta desse turismo já é uma razão bem motivadora.
Vai agradar a quem? A apaixonados por animais, a quem acha os primatas fascinantes, a quem adora uma aventura radical (rola passeio a vulcão ativo, lembra?), a quem quer conhecer melhor a África profunda e sua gente.