Era um problemão. Milhares de montanhistas, aventureiros, trilheiros sonhavam com conquistar o Pico da Neblina, a montanha mais alta do Brasil, 2.294 metros de imponência. No entanto, a alta exploração turística fez com que a rota de 36 quilômetros (quatro dias para ir e quatro para voltar), toda realizada em terra Yanomami, fosse oficialmente fechada em 2003. Porém, claro que as pessoas continuaram subindo o pico.
Usando índios das aldeias Maturacá e Ariabu (as mais próximas) como guias e carregadores (mal pagados), desafiando a Funai e o ICMBio, muitos tiveram suas expedições frustradas em pleno andamento. Para esses visitantes, a montanha era um desafio a ser superado, uma aventura na fronteira com a Venezuela (e vista para ela). Para os índios Yanomami, trata-se de um local sagrado, a “montanha do vento” ou Yaripo, em sua língua, habitada por poderosos espíritos. Visões bem diferentes que se chocavam.
Com o fim de evitar essa situação, foi criado o Projeto Yaripo, que visa regularizar as visitas e ainda promover um ecoturismo consciente, com a participação justa das comunidades locais. O interesse é tamanho que está rolando lista de espera para 2018 e 2019. É organizado pela AYRCA e tem o apoio de entidades como o Instituto Socioambiental.
Com um Yanomami no comando, é possível descobrir mais sobre a natureza, conhecimento tradicional e histórias de ancestrais desses habitantes. O objetivo maior é dar a conhecer a cultura indígena e seus direitos, enquanto gera uma renda sustentável a esse povo, em alternativa ao garimpo de ouro que ocorre nos arredores do Pico da Neblina. O ecoturismo, mais limpo, agradável e saudável poderá beneficiar mais de 2.700 pessoas, segundo estimativas (confira o incrível plano de visitação do projeto)
A aventura se inicia em Igarapé Tucano, terra indígena Yanomami, no município de São Gabriel da Cachoeira (AM), a 850 quilômetros de Manaus. São Gabriel, aliás, é uma cidade incrível para conhecer não só a cultura e gastronomia Yanomami, mas também as de outros grupos étnicos indígenas da região, como os Tukanos ou Akus. Em setembro, rola o Festival Cultural das Tribos do Alto Rio Negro (Festribal), boa ocasião para conhecer a região. Para chegar lá, pode ser de avião, expresso ou barco. Veja aqui a melhor opção para você.
São dez visitantes por grupo, sem contar o guia e os carregadores (não ultrapassando um total de 25 indivíduos). A carga é composta essencialmente por alimentação, acampamento móvel, utensílios de cozinha e itens pessoais. De acordo com informações do plano de visitação, a chegada ao cume ocorre no sexto dia da expedição e a caminhada nesse dia dura aproximadamente oito horas ida e volta. A área do cume é pequena e comporta até 15 pessoas (nem todos os carregadores precisam subir até ele).
Ainda de acordo com as informações oficiais, “no inverno (auge agosto e setembro), o trecho fluvial é facilitado com os rios cheios, ao passo que a trilha terrestre fica mais encharcada e impõe maior dificuldade aos caminhantes”. Já no verão (auge janeiro e fevereiro), embora rolem caminhadas mais secas, “a navegação fluvial se torna mais demorada porque com o rio baixo podem surgir trechos onde é necessário navegar em baixa velocidade ou, em casos extremos, pode ser necessário arrastar o bote.” Vale lembrar que, apesar da umidade e suas dificuldades, a melhor visibilidade do cume ocorre no inverno, mesmo.
Infelizmente não pudemos ainda vivenciar a experiência, mas, quer ler relatos em primeira pessoa?
Confira estes no Medium, n’A Folha de S. Paulo e na Trip/Gol.
São de babar. Assim como o já citado relatório e plano de visitação, que contém todos os detalhes.
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Escala de sustainatripity: 10 – junta os pilares ambiental (respeito à Amazônia), social (interação com os índios) e econômico (geração de recursos locais).
Por que vale a pena? Porque é uma experiência de imersão total em uma cultura nossa, pouco conhecida e ameaçada em nosso país.
Vai agradar a quem? Não é passeio para amadores, então, melhor se preparar bem, caso você não seja um montanhista. Além das variações de altitude, rolam travessias de igarapés, passagens por brejos e muito provavelmente momentos entre névoas, chuviscos ou tempestade (prepare-se para pés molhados). Não se iluda com a aparente simplicidade dos equipamentos indígenas e seus jamanxins (cesto-mochila de cipó). Vale se informar bem e avaliar suas condições antes de ir.