A ideia era aproveitar as praias e paisagens de um dos estados mais bonitos do Brasil. Mas o mau tempo que dominou a última Semana Santa no Nordeste não ia embora e fomos obrigados a diversificar os programas na tão sonhada viagem pela Paraíba. Sim, fazia quase vinte anos que eu queria conhecer João Pessoa – mais precisamente desde que fiquei fascinada pela cidade após bater um papo com uns paraibanos em um encontro estudantil na época da faculdade. Porém, dos cinco dias em que passei lá, choveu torrencialmente em três deles.
O que fazer nesses casos? Se jogar nas opções culturais pessoenses não deu muito certo (vários museus estavam fechados pelo feriado), então, vamos ao que interessa e que funciona de segunda a segunda: a gastronomia. Quanto a isso posso afirmar: que viagem! Do mais simples boteco de tapioca ao restaurante mais inovador da região, Jampa tem para todos os gostos. Seguindo nossa premissa de valorizar a cultura local ao máximo em todas nossas viagens (um dos pilares do turismo responsável), vamos a eles.
RAINHA DA TAPIOCA NORDESTINA (Tambaú)
Já tinha visto no TripAdvisor que esta era a tapiocaria mais bem cotada da cidade. E olha que não faltam opções por lá. É só parar em frente ao clássico Hotel Tambaú, ponto de referência de JPA, que você vai encontrar umas quatro ou cinco opções. Sem contar os estabelecimentos espalhados pelas ruas. O Rainha tem clima de boteco, cadeira de plástico, espaço pequeno, aquela mistureba (serve pizza também), dezenas de sabores doces e salgados (e você ainda pode montar a sua do jeito que quiser) e preço OK (tapiocas de oito a treze reais). Se eu gostei? Bom, não vi muita diferença de outras tapiocarias da cidade. O tão falado tamanho-que-dá-para-duas-pessoas não existe mais. Mas é uma tapioca boa. Embora a minha vizinha de mesa estivesse achando a sua insossa, a minha estava bem honesta. Detalhe importante: nós chegamos no dia em que ela estava sendo reinaugurada em novo endereço. Não fica mais na Almirante Tamandaré, como aparece na internet, e sim na Avenida Antônio Lira, quase esquina com a Avenida Olinda.
O que os locais estavam pedindo: tapioca de queijo coalho com banana e manteiga da terra.

MANGAI (Tambaú)
Ouço falar deste restaurante (que existe também em Natal e Brasília, mas nasceu em João Pessoa) há pelo menos uns dez anos, desde que comecei a escrever roteiros para programas de TV de viagem. Antes descrito como um self-service mais para simples, hoje é um restaurante enorme, de decoração caprichada (mesas grandes, sinos de boi enfeitando as laterais, luminárias de palha) e atendimento (garçons vestidos de cangaceiros) mais que atencioso. Continua no esquema sirva-se (66 reais o quilo), o que é absolutamente ótimo para quem quer provar os pratos típicos – e quando digo “provar” é realmente pegar o suficiente para saber se gosta ou não. Ou seja, você não precisa pedir buchada ou pernil de bode à la carte, nem muito menos o suvaco de cobra (feito com carne moída, ufa) pois esses pratos estão lá expostos, para você se servir com um pedacinho do tamanho da sua curiosidade. Eu não a tive. Mas caí dentro dos vários tipos de arroz cremosos (como o de leite e o de queijo coalho), os diversos peixes, o pão de macaxeira, tão fofinho (servido também como prato principal com carne de charque e coalho, numa espécie de bruschetta gigante), a paçoca salgada e dezenas de outras opções. Tipo, daria para criar um outro nível de “quem é você na fila do self-service”. Ah, também rolam umas saladas padrão, muitos queijos e outros pratos que você encontra em qualquer bufê, mas, para quê, né? Vale dizer que “mangai” é uma expressão antiga para lugar onde se encontra de tudo um pouco. Adequado.
O que os locais estavam pedindo: achei muito interessante ver várias famílias indo jantar lá dia de semana e pessoas fazendo quentinhas para ir comer em casa. Iam no trivial: baião de dois, arroz cremoso, um ou outro bode. Ah, e a sobremesa onipresente: cartola (banana com queijo coalho).

ESTALEIRO (Ponta do Seixas)
Chovia fino, decidimos ir conhecer o Farol de Cabo Branco (ponto mais oriental das Américas) e a Estação Ciência, prédio circular lindo projetado pelo Oscar Niemeyer. O dia estava preguiçoso e desanimado, já que eu não pude apreciar toda a beleza da Ponta do Seixas com aquele tempinho ruim, mas foi salvo pelo motorista de Uber que nos disse: vocês têm que ir ao Estaleiro. Que maravilha. E ainda por cima era pertíssimo do Aquário da Paraíba, que meu filho estava louco para visitar. Depois descobri que é um dos restaurantes mais queridos dos locais (era dia de semana e vimos muita gente “com roupa de trabalho” almoçando nele) e de turistas também. Lá pedimos a maior gordice da viagem: camarões empanados mergulhados em arroz de queijo coalho. Vieram sete espetados e pensamos: bom, só sete, mas, pelo menos são enormes. Surpresa: havia vários, vários camarões (empanados também!) escondidos no arroz. Saímos rolando, já que o prato era para dois, mas servia três facilmente. Há diversas opções para dividir (pratos por 60, 70, 80 reais, #chorariodejaneiro), ou seja, uma beleza. A especialidade é mesmo frutos do mar, com opções “mais light” como moquecas, peixadas, caranguejo, camarões (limpinhos, sem a tripa no dorso), caso você não queira cometer a mesma gulodice que eu. A cerveja Heineken estava geladinha e ainda rola um miniparquinho para crianças.
O que os locais estavam pedindo: pratos executivos, com peixe frito, por exemplo, que custam por volta de 30 reais.

NAU (Manaíra)
Chegou o momento de subir o sarrafo. Dos mesmos donos do Mangai, o Nau (que também tem filiais em Natal e Brasília) é a proposta mais sofisticada da grupo. Sabe aquele restaurante em que a família vai lá se reunir em dias especiais? Pois escolhemos um desses. Pena que todos na cidade tiveram a mesma ideia. Afinal, ele é conhecido por seus peixes e frutos do mar, então, advinha para onde foram todos os pessoenses na sexta-feira santa? Nós, que não somos esses religiosos todos, não nos tocamos e demos de cara com uma galera aguardando. O lugar é tão grande que a sala de espera é do tamanho de muitos restaurantes padrão. Não nos intimidamos. “30 a 40 minutos até sair sua mesa”, nos disse a recepcionista. OK. Nos sentamos imaginando que levaria pelo menos uma hora e eis que o aparelhinho (tipo aqueles do Outback) tocou depois de 20 minutos. Isso porque o lugar é imenso e a rotatividade é grande, então, mesmo em pleno feriado a fila andou rapidinho. Não demoramos muito para escolher, afinal, já tínhamos admirado a decoração linda (toda inspirada em barcos), espiado a área infantil, lido e relido do cardápio. Decidimos provar o moqueca de camarão e peixe. Não sei nem descrever. Meu marido achou a melhor da vida dele. Eu ainda estou meio “bêbada” daquele molho, mas, sim, era espetacular. Camarões gigantes e limpíssimos, peixe macio e sem espinhas (nosso filho amou), farofinha de dendê, arroz soltinho, pirão divino. A carta de vinhos era ótima e perfeita para quem não tem acompanhante nessa bebida (meu marido foi de cerveja artesanal), já que tem taças (por volta de 20 reais) e vinhos de 375 ml (o que acabei pedindo, na faixa dos 50 reais). As garrafas padrão custavam para lá de 100 reais. Contando com a sobremesa (uma colher gigante de brigadeiro) e o café, a conta para três deu 270 reais. No entanto, existe um menu do dia a 54 reais (sem bebida) que dá para tornar o programa mais em conta. Fomos na filial de Manaíra da Rua Lupércio Branco, mas existe uma dentro do Manaíra Shopping também.
O que os locais estavam pedindo: vinho, muito vinho. E, mesmo sendo sexta-feira santa, havia gente se fartando de carne (filés bem apetitosos) com vinho tinto. Mas, a grande maioria foi de moqueca, mesmo.

ROCCIA (Tambaú)
Comecei falando do simples Rainha da Tapioca e, vejam, poucas quadras depois, na mesma rua, está o sofisticado Roccia, eleito em 2017 o melhor restaurante do Nordeste pela revista Prazeres da Mesa. Assim é Tambaú. O Roccia privilegia ingredientes regionais (do sertão ao mar) servidos com técnicas da alta gastronomia internacional do chef Onildo Rocha. O ambiente é lindo, de decoração minimalista e precisa, que não intimida (havia gente de bermuda por lá, afinal, estamos em uma cidade quente). Fui de ravióli de queijo de cabra (uma paixão), enquanto meu marido optou pelo atum selado com bolinho de mandioca. Nosso pequeno comensal foi no clássico mignon com arroz (prato infantil). Também havia fusions interessantes como o tartar de carne de sol e o nhoque de vatapá, mas, ficaram para a próxima. Os pratos (individuais) custam de 50 a 70 reais. Ainda traçamos de sobremesa (de 25 a 35 reais) um bolo de macaxeira com caramelo de rapadura, cuja crosta e recheio lembravam um crème brulé. Desta vez, acompanhei o marido na cerveja artesanal, uma IPA (deliciosa) e uma APA (boa) da Ekäut, fabricada no Recife. Mas havia vinhos a partir de 85 reais. Pedimos dois cafés e a conta (R$ 288), que pagamos com gosto, pois estava tudo impecável. Vale dizer que o local tem um bar do lado de fora, só com petiscos, a preços mais em conta (de 20 a 40 reais) e ambiente igualmente bacanudo. Aliás, a foto de abertura do post é justamente um deles, o capitão de feijão verde.
O que os locais estavam pedindo: ostras. Há um aquário delas no salão principal. E quase todas as mesas tinham o couvert, com chips de macaxeira, pasta de queijo de cabra, pipoca de feijão verde e pão (25 reais). Vale lembrar que o restaurante está na rede do Prato da Boa Lembrança (o desta temporada era uma barriga de porco com feijão verde, picles de mini legumes e jerimum assado).

QUIOSQUE MARLIN (Coqueirinho) – Dica Bônus
No único dia de sol de verdade, não ficamos em João Pessoa. Rumamos para o sul da Paraíba para conhecer as praias e falésias da região. A parada mais longa do passeio de buggy é na bombada Praia do Coqueirinho, que, embora bonita, não está entre as minhas favoritas de lá por ser muito turística. Fui com o intuito de conhecer o restaurante da região mais recomendado, o Canyon de Coqueirinho, que, de fato, é lindo. Porém, achamos que valia seguir a dica do nosso guia e comer uma bela moqueca no Marlin por 70 dinheiros em vez dos R$ 159 reais do Canyon. Foi uma boa pedida. Não era como a do Nau, mas, no contexto praia-pé-de-areia-criança-com-fome, foi certeira. A conta deu 111 reais, incluindo moqueca, pirão (muito bom), arroz, três águas, uma porção de feijão (o filho estava com desejo) e uma cerveja Serra Malte.
O que os locais estavam pedindo: não dava para saber quem era local ou quem era turista, mas estavam pedindo o mesmo que a gente – com exceção do feijão.
Uma observação final: em vários restaurantes o serviço (normalmente 10% da conta) não está incluído e quase sempre os garçons pedem para pagá-lo à parte, em dinheiro. Portanto, leve alguma quantia em espécie.
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