Uma ‘nova vida’ para um sabonete pode significar o renascimento de milhares de pessoas na fronteira da Birmânia com a Tailândia. Esse é o propósito do projeto Second Life Soap, que recicla restos de xampus, condicionadores e sabonetes de hotéis e envia para coletivos que precisam desesperadamente de itens de higiene.
O objetivo principal da iniciativa, criada há apenas três meses na Espanha, é reduzir a mortalidade infantil. Seus primeiros passos foram ao lado da Fundação Colabora Birmania, órgão que, desde 2009, busca melhores condições para a população birmanesa – em especial as crianças (cerca de 1200 delas), com a construção de escolas, creches e programas de formação.
Café em Chiang Mai ajuda refugiados birmaneses na Tailândia
A população infantil birmanesa refugiada é atualmente o foco do Second Life Soap. Mais especificamente a que vive em Mae Sot, na Tailândia, a quatro quilômetros da fronteira com a Birmânia.
Estima-se que haja 200 mil imigrantes desse país nessa região, muitos deles vivendo em algum dos nove campos de refugiados. Eles fogem da ditadura militar (que mudou o nome da nação para Myanmar) e dos conflitos entre o governo e as minorias étnicas – configurando uma das guerras civis mais longevas da História (desde 1964).
HÓSPEDES SÃO INFORMADOS
Facilitar o acesso a produtos de higiene básicos em lugares onde existe um alto risco de contrair doenças infecciosas. Com essa missão, a Second Life Soap convida hotéis como os da rede Sercotel a colaborarem. O projeto atua em 24 dos 200 estabelecimentos dessa cadeia, que está presente na Espanha e em Portugal. Mas a ideia é expandir-se ao longo do ano.
“Acreditamos que mais hotéis vão aderir. Estamos buscando parcerias a fim de conseguir mais e mais clientes que decidam mudar suas economias lineares tradicionais para economias circulares mais ecológicas e eficientes”, conta Javier García, gerente geral e cofundador, ao Viagem Viva. A ideia é, segundo ele, que “os resíduos de uns se tornem recursos para outros”.
Funciona assim: após fechar o acordo com o alojamento, os funcionários do hotel precisam separar as sobras de sabonete (líquido ou em barra), xampu, condicionador, cremes e gel que não foram usados pelos clientes em recipientes especiais. A Second Life Soap recolhe esses restos, que passarão por um processo de reciclagem para se tornarem próprios para uso.
Além disso, a organização também fornece material por escrito em diferentes idiomas (inglês, francês, alemão e línguas espanholas) para os hotéis informarem seus hóspedes. Além de enviar os itens reciclados aos campos de refugiados, locais como orfanatos e escolas também são beneficiados. A ideia é chegar a diferentes lugares que tenham sido afetados por catástrofes humanas ou naturais.
FALTA DE HIGIENE MATA UMA EM CINCO CRIANÇAS
Lavar as mãos diminui em até 47% o risco de contrair diarreia, que, em países subdesenvolvidos, pode matar. A importância do sabão salta aos olhos quando descobrimos que a falta dele, de acordo com a Unicef, pode matar uma em cada cinco crianças, seja pela citada diarreia ou por pneumonia, entre outros males. Mais de 750 mil bebês morrem por ano por más condições de limpeza, segundo esse órgão da ONU.
Essas doenças, quando não levam a óbito, atrapalham o desenvolvimento das crianças. Cerca de 35% dos menores birmaneses de cinco anos têm algum atraso no crescimento. A expectativa de vida no país é de 66 anos, ostentando a triste estatística de ser detentor de mais da metade dos casos de malária do Sudeste Asiático. Uma enorme crise sanitária.
Vale lembrar que a iniciativa do Second Life Soap ainda tem o efeito colateral de evitar o acúmulo de resíduos no lixo. Uma excelente ideia, principalmente para estabelecimentos que não aderiram aos recipientes de vidro ou a granel, uma nova tendência nos hotéis para diminuir o plástico.
—